Você deve saber o motivo do nome do camisa 9 do Flamengo no FIFA 21 ser Oswaldinato e não Gabigol. Sabe né? Não? Pode deixar que nós explicamos, fica tranquilo.
Isso acontece por que os jogadores que atuam no Brasil nunca receberam pagamento em troca da autorização pelo uso de suas imagens. Isso desencadeou uma série de ações contra a EA Sports ao longo dos anos. Mas novos documentos recebidos pelo FIFA Brasil Noticias mostram que a história não é tão simples assim.
https://twitter.com/Alenc4r_/status/1234882389010190338
Comprovantes de pagamento são divulgados
Comprovantes de depósitos obtidos nas últimas semanas indicam que a Fifpro (entidade internacional que une os sindicatos nacionais de atletas) repassou pelo menos U$S 2,471 milhões para a Fenapaf (Federação Nacional dos Atletas de Futebol) pelo que entendia ser a cessão dos direitos de imagem dos jogadores que atuam no Brasil para a utilização no FIFA e Pro Evolution Soccer (PES).
A Fenapaf, porém, não tem direito sobre a imagem dos atletas e não pode negociá-lo. A legislação brasileira diz que só o atleta poderia licenciar seu direito de imagem, a menos que fosse firmado um acordo coletivo com sindicatos, o que não aconteceu. A Fenapaf diz que não cedeu esses direitos e que a verba recebida vem de um mecanismo de solidariedade. Mas uma troca de e-mails entre o então presidente da entidade e membros da Fifpro indicam que a entidade brasileira já falou que podia autorizar a cessão.
As fontes ouvidas pela reportagem, ligadas à Fifpro e que participaram da negociação com a EA Sports, dizem que os pagamentos tinham como objetivo o licenciamento da imagem dos jogadores. Os comprovantes bancários também foram registrados como pagamento de royalties.
Desde 2015, jogadores brasileiros processam as duas produtoras alegando uso ilegal de suas imagens —todos dizem que nunca receberam repasses pela participação nos games. Atletas como Paulo Baier, Alan Ruschel e Neto, ex-Chapecoense, já venceram na Justiça.
É por causa dessas ações que a produtora canadense mudou sua forma de atuação no Brasil, sendo assim nítida a desistência de usar nomes e imagem dos atletas brasileiros.
Um guerra que está longe do fim
No ano de 2015 houve uma quebra no relacionamento entre a Fifpro e o Brasil. O marco foram as primeiras ações coletivas de jogadores que atuaram no Brasil entre 2004 e 2020 contra as produtoras de games de futebol.
As ações coletivas foram ajuizadas pelos sindicatos de São Paulo, Santa Catarina e Minas Gerais. A EA foi condenada nas ações dos sindicatos mineiro e catarinense a pagar R$ 7 milhões e R$ 6,5 milhões respectivamente, mas recorre das duas condenações. Para a Justiça, a EA Sports informou que a empresa comprou os direitos pela utilização dos jogadores da Fifpro, que repassaria a verba para os sindicatos nacionais.
A reportagem teve acesso a prints de uma troca de emails de 2008 (abaixo) entre Rinaldo Martorelli, então presidente da Fenapaf, e Theo van Segellen, secretário-geral da Fifpro entre 1992 e 2020, e Kris Vis van Heemst, diretora de relações institucionais da Fifpro.
Nela, Martorelli afirma que “não temos problemas com os direitos de imagem em nosso país —não duvidem que pagamos os jogadores todos os anos — duas vezes ao ano — seus direitos de televisão e isso significa temos a possibilidade de representá-los oficialmente” e “temos os direitos que interessam à Fifpro”.
Fenapaf emite comunicado oficial
A entidade enviou uma nota de esclarecimento dizendo que a “FENAPAF esclarece que as movimentações citadas ocorreram na gestão do seu então presidente Rinaldo Martorelli, também presidente do Sindicato de Atletas de São Paulo desde 1993. A FENAPAF nunca reuniu condições jurídicas de receber valores de direito de imagem da FIFPro em nome dos atletas.”
Em uma nota publicada no site do sindicato de atletas de São Paulo, presidido por ele, Martorelli diz primeiramente que os valores repassados pela Fifpro eram contrapartida por uso de algumas propriedades: “A FIFPro obtém receitas negociando com as empresas de jogos eletrônicos e repassa aos sindicatos nacionais que compõem sua base. De fato, uma das exigências desse repasse é que os sindicatos entreguem o uso das imagens dos jogadores, mas não é única rubrica considerada. O uso do nome e logotipo do sindicato, a colocação da seleção nacional do ranking da FIFA.”
Em seguida, diz que eram doações: “Outro fato que corrobora que os valores jamais foram recebidos pela imagem dos jogadores é a forma como eles eram recebidos pelo Banco Central: ‘doação'”.
Um documento de maio de 2014, assinado pelo secretário-geral da Fifpro, Theo van Seggelen diz concordar com “o documento de data de 13 de maio de 2014 de referência Posição sobre Direitos de Imagem e que estamos de acordo com seus termos”. A reportagem não teve acesso ao teor completo desse documento.
Na mesma nota, Martorelli diz que “não havia responsabilidade de repasse aos jogadores porque nunca foi outorgada essa licença pela Fenapaf.”
E o que diz a Fifpro?
As fontes ouvidas pela reportagem dentro da Fifpro se recusaram a dar entrevistas, mas afirmaram que os pagamentos direcionados para a Fenapaf entre 2011 e 2019 tinham como objetivo o pagamento dos direitos de imagem. E alegam que os valores, significativamente vultosos e efetuados para a entidade brasileira duas vezes por ano, excluiriam a possibilidade de terem sido feitos para pagamento de solidariedade.

Em nota enviada para a reportagem, a Fifpro limitou-se a dizer que “é uma organização sem fins lucrativos que adquire direitos de imagem de sindicatos de jogadores filiados e negocia a venda desses direitos com empresas de videogame.
A Fifpro redistribui a receita gerada com a venda para os sindicatos cujos jogadores filiados decidem dividi-la ou usá-la para fornecer serviços aos jogadores, como assistência jurídica, aconselhamento de segunda carreira e assistência médica”.
Será que podemos ter ainda o Brasileirão licenciado?
A Fifpro, segundo apurou a reportagem, ainda tem esperança de que as condenações aos seus parceiros comerciais, EA Sports e Konami, sejam revertidas no Brasil. O sindicato global dos atletas já perdeu aproximadamente U$S 20 milhões por conta da confusão brasileira e os custos podem subir exponencialmente se as condenações forem mantidas.
Embora a Fifpro não seja parte direta nos processos, o sindicato terá de arcar com eventuais prejuízos causados às produtoras ou enfrentar processos exigindo o direito de regresso, que é o direito de ser ressarcido de um prejuízo causado por terceiro em juízo. A Fifpro vendeu para EA Sports e Konami um ativo que ela não detinha na realidade. Da mesma forma, a Fifpro pode buscar reparação financeira usando o mesmo direito de regresso, contra a Fenapaf.
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